sexta-feira, 8 de fevereiro de 2019

Por quê parei de ouvir vinil?

          Parece burrice, mas nos anos noventa todos se maravilharam com o cd, com o som limpinho, sem estalos e chiados, e hoje rejeitamos essa maravilha e voltamos ao bolachão. Como foi que eu fiz isso?
        
         Os motivos que me levaram a renegar o vinil, e as fitas K7, são de origem pessoais, econômicas e de conjunturas históricas. Parece que tudo conspirava contra o discão, era para acontecer, só os fortes resistiram. E eu não fui uma excessão, embarquei na onda digital de cabeça, até batê-la no fundo e perceber a burrice. Vou analisar o meu caso, com base nesses 3 motivos citados, só que na ordem inversa.

             Causas históricas: nos anos noventa não tínhamos o cuidado que temos hoje. O disco era relativamente barato, emprestava-se, não cuidávamos de aparelhos e mídias. O que ocorreu é que no final dos anos noventa os discos estavam sujos, desgastados, arranhados e os aparelhos deteriorados. Era muito comum você ligar o três em um e ouvir aquele raspar de potenciômetro velho. Sem contar que a maioria tinha equipamentos de marcas baratas, eram simples e de baixa qualidade. A limpeza era feita da maneira mais equivocada também. Passava-se um pano, ou aquelas flanelas com álcool isopropílico, o que aumentava a estativa e consequentemente os estalos. Resultado, agulhas velhas, discos sujos e som ruim. Até as lojas que gravavam fitas k7 deixavam evidente que não tinha como melhorar o som de maneira fácil. Quando iam gravar uma fita colocavam álcool sobre o disco para abafar o chiado e os estalos. Era o fim.

            No meu caso específico lembro de ir a casa de um amigo e ele vir animado dizendo que comprou uma agulha nova para o seu toca discos, só que era de safira. Agulhas de diamante estavam escassas, e caras, aquilo era o que tinha. Para quê? Som ruim, disco pulando, chiado, estalo tudo de ruim. Era o fim, não dava mais para ouvir vinil. Naquele dia decidi que iria entrar de cabeça no cd, cujo som era melhor. 

             Conjuntura econômica: falei que o discão era relativamente barato, e ficou ainda mais. Lojas liquidando, discos novos a menos de dez reais, se fosse corrigir pela inflação que fosse algo em torno de cinquenta, mas mesmo assim era barato. E os aparelhos ficando caros, e raros. Não tinha agulha, nada. Já o cd vinha com tudo. O disco era mais em conta, e os lançamentos abundavam. Era o paraíso. Discografias inteiras sendo lançadas, álbuns que nem sabíamos que existiam, e o que é melhor, com som limpo. O digital era o futuro. Rapidamente os preços ficaram mais baixos ainda. Discos em banca, dez reais um fascículo com uma peça erudita. Cds no 1,99, tenho vários aqui ainda. 
      
            Os aparelhos estavam na mão. O discman foi revolucionário. Além de agora você ouvir os dois lados do álbum de uma vez só, ou até dois discos em apenas um, dava para levar aquele som límpido no bolso. Lembro-me de nos idos de 1997 ouvir no ônibus o The Division Bell do Pink Floyd, que viagem, tenho esse cd até hoje. Quando surgiram os cds gravados, ou os piratas, aí a música digital dominou de vez. Que mané disco de vinil o quê, por um real você comprava a mídia e pedia para o seu camarada fazer uma cópia. 
Aí então o milagre, MP3. Aí sim, piramos. Dava para colocar uma discografia de uma banda toda num cd. A qualidade... é, não era aquelas coias, mas quem tinha um computador tinha tudo o que sempre quis ouvir, coisas às quais jamais teríamos acesso na época do vinil. Era isso, a era digital era mais do que barata, era de graça!
Motivos pessoais: até vieram me alertar que isso era furada. Um amigo que tinha altos vinis, putz, aquele duplo ao vivo do Led Zeppelin, explicou o lance da música digital, a superioridade do analógico, etc. Mas não, eu me iludi com o cd. Para mim era mais prático, mas sofisticado, barato, melhor. Fiz minha discografia do Pink Floyd, coisa que na época do vinil seria impossível. Tanto por não conseguir encontrar os discos como pelo custo. Para mim o cd era tudo. Comprei dezenas, originais, piratas, gravei arquivos de mp3 e achava vantagem. Tudo bem, você que sempre ficou com o vinil pode estar me chamando de imbecil e tudo mais, mas veja o meu lado: o cd me trouxe o impossível! Quando eu encontraria discos raros, gravações praticamente esquecidas? Até hoje, seja honesto, tem coisa que é impossível você conseguir em vinil. Se não fosse a música digital jamais poderia parar para ouvir centenas de vezes o Racional 1 e 2 do Tim Maia. 

             Para mim o vinil era impraticável. Passei os anos noventa e a primeira e segunda década do século XXI só ouvindo música digital. E funcionou. Dirigi milhares de quilômetros ouvindo discografias inteiras. Relaxei, meditei, horas a fio ouvindo infinitas listas de música de relaxamento. Pois é, mas hoje eu vejo que poderia ter sido melhor. Poderia sim continuar a ouvir as infinitas discografias digitais no carro, no ônibus, na sala de espera. Mas, poderia ter me permitido ouvir um som mais puro em casa, o som do vinil. 

            Nunca é tarde, e hoje ainda bem estou curtindo meus discos. Nesse exato momento, estou ouvindo o Meddle do Pink Floyd. Discão que comprei no sebo semana passada, oitenta reais. Capa surrada, mas o disco está em ótimas condições. Vamos ouvir o vinil.